quarta-feira, 2 de novembro de 2022

Quem ganhou foi Lula; quem venceu foram os anos 90.

64, 66, 68, um mau tempo talvez
Anos 70, não deu pra ti
E nos 80 eu não vou me perder por aí...

[Horizontes, Bailei na Curva, Flávio Bicca Rocha]


Quem venceu as eleições foram os anos 90, ou o espírito que os formou, com todos os seus erros e acertos. A divisão do país não foi gestada nos 90, lá estávamos sendo apenas criados, porcamente educados de maneira irrestrita e ampla, pela primeira vez, vimos a expansão real da educação coadunada com o desejo de trabalhar e progredir, sem divisões. Pela primeira vez, desde os anos 50, houve a oportunidade de enxergar uma realidade não-inventada, completamente dependente de nós mesmos. Não tenho dúvida que as futuras gerações olharão para os anos 90, como olhamos para os 50 e pensarão: "parece que foi a última vez que tivemos uma chance". 

As viúvas de um período que não viveram não são muitas, nem a maioria, não provocam um empate ou uma "divisão" por dois do Brasil. A realidade inventada da divisão é proposital. O mapa acima mostra, justamente, que a divisão não veio dos anos 90, foi amplificada pela incapacidade de uma parcela coadunada e captada para não aceitar o que nos educou e criou. Pelo contrário, mostram que foi gestado um buraco entre o Brasil do presente e do passado. Um buraco gigantesco, olhado com estranheza pelos mais atentos em economia e social, esse buraco gigantesco venceu, é o Merthiolate arde para nos curar. É a frustração da escolha que foi nossa e precisamos reconhecer como nossa. Quem venceu foi a banheira do Gugu, os Mamonas Assassinas, Bebeto e Romário. Nossas viúvas são jovens e idosos, não são pessoas que tenham de fato passado pelos anos 90 e entendido que se tratava de uma ironia da história nos cobrando responsabilidade e frustrações pelos nossos erros. A ideia de liberdade resiste aos anos noventa, apenas porque, sim, existe uma parcela inventando a possibilidade de sermos irresponsável, como éramos antes dos anos 90. Sequer o poderoso sentimento de liberdade nos divide.  

Finalmente, todos os brasileiros foram obrigados a aprender a se frustrarem. Nem todos conseguem absorver a lição, mas ninguém consegue ignorá-la, porque ninguém, antes, ofereceu essa oportunidade para os brasileiros, agora, sim. É necessário um homem pequeno, diminuto e imoral para o maior elogio que a liberdade irresponsável já viu. É necessário transformar a liberdade irresponsável em ignorância orgulhosa. Foi necessário a idolatria para chegar à frustração. A mediocridade, como autodefesa da realidade não-inventada, precisa dar lugar a frustração. Inventa-se micro-realidades, para atender a demanda. 

Por certo, que o medíocre não é o único que se frustra, mas é o único que não reconhece a frustração como um objeto interno a ele mesmo. A frustração do medíocre não vem como vem a derrota de uma pessoa normal, precisa ser transferida às esferas mais baixas entre seus pares. As massas de medíocres se insurgem para defender o único, entre eles, que catalisam como responsável pela realidade. A marca indelével dessa transferência de responsabilidade não é uma marca característica dos anos 90, mas todas as outras características se mostram um pouco maiores, a ponto de vencer um passado irresponsável. 

Fundamentalmente o que vimos foi uma vitória dos anos 90. Aqueles que reclamam "empate" apenas delimitam o acerto. Foi nos anos 90 que os medíocres aprenderam que empatar é pior do que perder: um esforço muito maior precisa ser empregado pelo derrotado para chegar, absolutamente, no mesmo lugar que chegaria se já se declarasse um mísero derrotado por cansaço. Os anos 90 triunfaram sobre a mediocridade. 

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