quarta-feira, 26 de julho de 2017

O lado ruim da nossa resiliência

Somos permissivos.


'Brasileiros às vezes toleram coisas que não deveriam ser toleradas'. A frase foi dita na despedida do embaixador britânico que atuou no Brasil por três anos e meio, Alex Ellis. Admitir a nossa permissividade pode fazer parte do processo de reconhecimento da culpa. Um pré-requisito para suportar a injustiça de olhos limpos é justamente a expectativa de se beneficiar dela, algum dia.

As reformas reais que o Brasil necessita, incluindo pacto federativo, reforma fiscal e eleitoral, não foram feitas em picos de popularidade presidencial. Por certo, não serão feitas por mandatários que têm tanta intimidade com a urna quanto interesse pela qualidade de vida da população. Não teremos o fim da distribuição do afago das emendas parlamentares; também não há nenhuma maneira do governo reduzir os seus gastos extraordinários, regalias e cargos de comissão. Curiosamente, mesmo sem nada disso, não teremos panelaços e camisas verde-amarelas dançando ao redor de nenhum pato gigante. É a confirmação da máxima de Ellis.

Bradar aos quatro ventos que não gostamos de corrupção não impede a nutrição de um carinho distante por corruptos bem sucedidos. Existe outra justificativa para assistirmos deputados que devem montante superior a R$530mi à União votando o perdão de dívidas fiscais, sem que uma única lágrima de sangue seja derramada para impedir que isso progrida no Congresso? Alguma sugestão que explica uma reforma trabalhista que não altera em nada a colônia de férias de marajás e joga a conta integralmente para o trabalhador assalariado ou o aumento de impostos incidindo diretamente sobre o bolso do consumidor e do setor produtivo? Nada. É o barulhento silêncio das ruas misturado com a resiliência de um lugar que transformou covardia em virtude.

No próximo ano, veremos o mesmo cenário político com uma leve alteração dos seus personagens, teremos ainda um aumento no desinteresse do eleitor pelo voto, o crescimento da centralização de poder e a amplificação da destruição de estados e municípios. Somos uma nação de tolerantes construída de tragédias anunciadas.

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