sexta-feira, 15 de abril de 2016

Isentões e liberdade de acesso a informação

Ficar em cima do muro não é fácil. Duvida? tenta ficar em cima da tela que instalaram na frente do Congresso!

O afloramento dos ânimos em momentos conturbados da história política não é uma novidade brasileira. É possível remontar vários períodos nos quais governantes viram-se diante de “nós”, aqueles que os apoiam, e “eles”, os conspiradores. Foi assim contra Getúlio Vargas na Revolução Constitucionalista de 32 (ou seria golpe, contragolpe?); a Alemanha, por sua vez, espera jamais precisar revisitar o sentimento de divisão da República de Weimar, entre as duas grandes guerras, e suas consequências desastrosas. Quando a disputa ultrapassa o futebol, o acirramento entre defensores e detratores se instala no ambiente político. Com isso, podemos visualizar uma polarização muito particular, diferente da separação de classes e raças, mas capaz de atingir esses segregacionismos horrendos com uma velocidade incrível.

A única originalidade da atual crise política que o país vive agora é diretamente ligada com o amplo acesso à informação, seja pela transparência das fontes investigadoras, Ministério Público e Polícia Federal, ou em virtude dos meios, imprensa, veículos de comunicação e, muito especialmente, as redes sociais. A proximidade entre os receptores desse conjunto sufocante de informações acirra ainda mais a divisão entre os grupos. O simulacro de democracia atinge sua forma mais elevada, pois vemos centenas de opiniões com as quais concordamos, misturadas com informações e boatos que as ratificam, passando verticalmente diante dos nossos olhos. Somam-se a isso outras opiniões, boatos e informações que agridem nossa posição inicial, são publicações e compartilhamentos dos nossos “inimigos”. Banham-se nessa cascata julgamentos prévios os respectivos grupos, já bem tipificados: “direita-coxinha” e “esquerda-mortadela”, os bisnetos dos adjetivos “chimangos” e “maragatos”, originalmente usados com conotações depreciativas.

Existe, contudo, um grupo que sempre chamou pouca atenção nesse duelo, mas se trata do único verdadeiramente resistente, sem muitas nuances ao longo da história. Os “isentões” não escaparam da tipificação das redes sociais e ganharam um apelido bem particular. Por isentão não estamos falando de alguém pouco preocupado com a crise institucional e moral da política brasileira. Pelo contrário, basta que o internauta não morda o biscoito de um dos extremos ou se comporte de uma forma cética diante de boatos disfarçados de informações para ser enquadrado no grupo. Não entrou na histeria coletiva? Isentão!

O surgimento dos isentões me fez pensar se é possível existir um radicalismo genuinamente de centro, um democrata intransigente, capaz de sustentar que nenhuma opinião deve ser embargada, nenhuma informação relevante deve ser censurada e, diante da alteração dos fatos, as posições também podem ser alteradas, independente do lado para qual elas se inclinem. Uma democracia madura parece exigir esse tipo de radicalidade. Sempre que há uma tentativa deliberada de anular um dos polos, suas opiniões, a forma como elas são expressão nas redes sociais ou o conteúdo da imprensa livre estamos diante de um retrocesso de prejuízo incalculável. Se essas tentativas tivessem eficácia real, os Papeis do Panamá jamais teriam sido publicados, o maior esforço jornalístico global de todos os tempos esbarraria no poder de barganha descomunal de banqueiros em paraísos fiscais e autoridades políticas dos cinco continentes. Precisamos decidir se queremos um ambiente político, econômico e social transparente ou “transparente dependendo do alvo”.

O mais prejudicado com todas as tentativas, judiciais ou políticas, de anular seus contrários é justamente o público médio, aberto para formar sua própria opinião, capaz de reconhecer as tentativas de manipulação e consciente dos efeitos terríveis da censura. No fundo é isso, precisamos proteger os isentões. 

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