quarta-feira, 5 de março de 2014

A velocidade mata; mas a lentidão também

Sou um sentimentalista, no sentido científico da palavra. Ciência é feita com sentimento de generalização moral. É carinho pelos números. Sozinho e isolado o dado é um mentiroso em potencial, à disposição de quem quiser espreme-lo. Claro que fico assustado com o número de mortes nas estradas durante os feriados, como é o caso do período carnavalesco. Mas me assusta mais a tentativa destrambelhada das autoridades de trânsito de mascararem os verdadeiros culpados pelas mortes: as autoridades políticas responsáveis pela construção e manutenção das estradas.

A maior causa de acidentes fatais não é a velocidade empregada é a falta de oportunidade para desenvolver a velocidade empregada. Definitivamente, é muito menos perigoso andar a 140km/hora em uma rodovia duplicada do que andar a 40km/hora durante 2 horas atrás de um caminhão. É o caminhoneiro o culpada pela lentidão em uma auto-estrada ou é da sucessão de infelizes que ocuparam cargos em administrações públicas e permitiram que isso acontecesse? Não deveríamos sequer ter a audácia de raciocinar uma estrada sem duplicação. Quando pensarmos em implantar uma via alternativa já deveríamos pensar em duas, três, quatro pistas. Mas não. Facilitar a vida dos carros é feio. Afinal, temos um transporte coletivo de primeiro mundo. Não há motivos para construirmos estradas.

Andar a 140km/hora nas nossas estradas é realmente um ato criminoso. Mas permitir o desperdício de tempo, combustível, desgaste mecânico e humano a 40km/hora, atrás de um caminhão ou ônibus, não é crime. É normal. Coisa do cotidiano. Velocidade mata. Mas lentidão e burrice administrativa matam mais. Não se pode culpar tanto assim os afoitos por ultrapassagens imprudentes. Ele não flertou sozinho com a própria ignorância.

Pior é o que se vive no estado do Rio Grande do Sul. Aqui, opera o senso arrecadatório. Não há estradas. A velocidade é controlada pelos buracos ou pelos caminhões. E, ao menor trecho em condições de dirigir, coloca-se um pardal. Multa-se o excesso. Mas não se multa a falta. Cada governador, cada presidente, deputado e magistrado tem as mãos sujas de sangue, pelas mortes nas nossas estradas. O resto é imprudência e conversa fiada. A velocidade, sozinha, não mata ninguém.

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