sexta-feira, 7 de março de 2014

Primeiro dia de aula

Todo mundo sabe que eu detesto assuntos pessoais. Afinal, nada mais tedioso do que nossas vidas. Nada mais desinteressante do que nossas opiniões íntimas a respeito de coisas particulares.

Sejamos tediosos, ao menos, por ora.

Lembro-me do meu primeiro dia de aula na pré-escola como se fosse uma noite de bebedeira confusa. Chorei como um bebê; e o frio na barriga, natural em todas as crianças da espécie, se transformou em pavor. Vomitei as tripas, e passei metade da minha premiere no mundo social enfurnado na sala dos professores, depois de alguma dose de antiemético. Fui resgatado no final da tarde pela minha vizinha, e cheguei em casa dizendo que não aconteceu nada, tentando manter o peito ereto, apesar da palidez cadavérica. Deve ter sido um dos dias mais longos da minha vida.

Nas semanas seguintes, melhorei. Nos anos seguintes, contava os dias para a volta às aulas. Hoje, velho, com os dentes caindo e praticamente com 30 anos de idade, volto a ter um frio na barriga. E olha que eu só fiquei um ano fora da universidade, entre o mestrado e o doutorado. Não sei o que faz as crianças terem frio na barriga no primeiro dia de aula. Não sabia aos 5 anos. Não sei agora. E, muito provavelmente, não saberei aos 50. É como saber o que fazer quando cantam "parabéns pra você" para você. Ninguém sabe como se comportar. É um tipo de tensão esperada, com um resultado previsível, mas totalmente constrangedora.

Espero que o frio na barriga passe logo. Mas não acabe nunca. É como um marceneiro que perde completamente o medo da máquina, e acaba perdendo o dedo. 

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