terça-feira, 30 de abril de 2013

Entonces

Faz umas duas horas que fui demitido, mais ou menos. Dez minutos antes de ser enxotado (burra palavra bonita, né?), entrevistei o ex-ministro da agricultura Alysson Paulinelli. Ele disse que a ditadura militar investia 4% do PIB em infraestrutura. Hoje não investimos meio por cento. Não é o suficiente nem para manter o que foi construído. A conta, é provável, só veio mais tarde. Conta da ditadura. Eu ainda estou pagando a minha.

Estou cada vez mais convicto de que a ausência de hombridade está acabando com nossas vidas. Ou adiantando nossas mortes diante do Facebook. Pessoalmente, acho que o reconhecimento desse problema pode salvar a minha vida, pelo menos. É tamanha a falta de caráter e o vício desvairado nessas idiotice que faltam homens de respeito no mundo. Digo isso porque todos já conversaram com tampas de notebooks. Pior: todos já ofereceram aos seus interlocutores conversas com tampas de notebooks. E isso, sinceramente, me deixa profundamente descrente na raça humana.

Agora estava conversando com um colega de profissão e falando do meu enxotamento (palavra mais bonita que o adjetivo) e notei que a falta de franqueza e olho no olho chegou ao limite do inconveniente. O motivo, por certo, não foi meu amigo. Mas uma pergunta que ele me fez: "tá, e tu foi demitido por quê?"

Ponto. Nova linha.

Sinceramente, não tinha parado pra pensar nisso antes. Para mim, foi tão natural ser demitido quanto ser contratado. E me dei uns segundos de trabalho para responder a questão do meu amigo: "Fui demitido porque fui contratado". A moça do RP assinou minha carteira e a entregou rescindida. No mesmo instante.

A resposta pode parecer falta de resposta melhor. Mas não é. Fui demitido, apenas, porque fui contratado. Não foi por falta de pautas (um repórter vive disso). Nem por falta de entrevistados (um entrevistador vive deles também). Não foi porque meu texto é ruim ou porque eu não sou ágil para a função. Fui demitido, portanto, porque não deveria ter sido contratado. Não deveria estar ali, em um ambiente absolutamente inconveniente para mim. Dei sorte é de ter sido demitido tão rapidamente. Se tivesse ficado em um lugar onde não deveria estar, seria um ridículo. Jornalista não trabalha para pagar as contas. Até porque o salário não dá nem para isso. Jornalista que trabalha para fazer média pode muito bem virar dirigente sindical. Copiar e colar letras aleatórias em papel que vai embrulhar peixe no outro dia ou falar sobre perfumaria, definitivamente, não é um trabalho que requer amparo profissional.

Volta o ponto inicial dessa coisa toda: a falta de hombridade é muito mais acentuada do que a mera ausência de olho no olho para dizer: "você não resolve tal e tal problema para mim. Portanto, vá embora". Fosse apenas isso, seria covardia e não falta de hombridade. Com covardes, podemos conviver. É difícil, mas não impossível. Já a falta de hombridade é identificada em pessoas sem a menor capacidade de assumirem compromissos sérios e dentro dos prazos adequados. A incompetência em desempenhar uma função é apenas incompetência, mas somada a falta de responsabilidade e peito aberto para resolver problemas, é falta de hombridade pura.

Eu, honestamente, não consigo viver de fazer média para pagar as contas. Prefiro pagar as contas de outra forma, como sempre fiz, e deixar a vida em stand by, até algo relevante e feito por homens se mostrar como uma oportunidade concreta.

Definitivamente, hoje o jornalismo é uma profissão onde falta hombridade. E isso não tem nada a ver com o sexo de quem está por trás da tampa do notebook.

***

Essa última experiência, fez-me lembrar de um velho texto do Gabo.

Um comentário:

Vani disse...

Bah! Mas estas certo sobre falta de hombridade. Acredito que ela está atrelada a falta de respeito. Tu és dos poucos caras que conheço que poderias viver tranquilamente na época em que os compromissos eram firmados na confiança do "fio do bigode". Faltam homens homens, gente gente...
Espero que algo digno de ti surja logo, logo.
bj amigo.