sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Desejo de ter filhos? Procure seu médico [psiquiatra]

Todo mundo viu que eu escrevi um texto para o PdH digno de um baita alvoroço. Como a maior parte das coisas que eu faço, o único mérito lá é não ter valor algum. "Não existem valores morais objetivos", repito. Mas não adianta. Serei xingado, enquanto o pessoal não conseguir refletir sobre algo elementar e visualizar que sequer os meus valores morais têm objetividade. O que importa, para os leitores médios, é que eu falei mal da santa maternidade. Logo, sou um cretino. Seria um cretino na idade média, caso falasse mal da santa igreja. Pelo menos sou um cretino moderno. A vanguarda da retaguarda!

Não vou revisar o meu próprio texto. Não vou me explicar. Não vou desdizer o que eu disse. Muito pelo contrário: cada palavra daquele texto é datada e assinada. E eu sou o responsável por elas. Ninguém mais. Sou o único com o título de escritor-maldito-irrelevante. Não abro mão da minha vaga.

No PdH meu objetivo, como fica claro para quem apenas passa o olho pelos títulos dos outros textos, é falar sobre mulheres. Naquele texto, eu falo do desejo de maternidade, não de paternidade, porque minha preocupação são as mulheres e não os homens. Simples. Elogio e xingo apenas mulheres. Os textos elogiosos, evidentemente, não têm tanta repercussão. Paciência. Evidentemente, um homem com o desejo sincero de ter um filho é alguém de caráter igualmente perturbado. Exatamente como eu descrevi lá a respeito de alguém desejosa de ser mãe, mas do outro sexo, um pai. Um desejoso de ser pai. Uma desejosa de ser mãe. Duas pessoas de péssimo caráter.

Outro ponto que precisa ser desenvolvido é o seguinte: eu não estou preocupado com aquilo que é. O que me interessa é o desejo das pessoas naquilo que deve ser. Como eu deixei claro: não me importam os ditados da natureza (aquilo que é). Então, o que me interessa? Relevante para a discussão da cretinice maternal ou paternal é, repito, o desejo. Eu não disse que ter um filho é algo de alguém miserável. Eu disse, e repito: desejar ter um filho é uma vontade exclusiva de alguém miserável. Se você deseja ter um filho, sendo homem ou mulher, você é egocêntrico, narcisista e precisa de ajuda. Não me leia. Procure um psiquiatra.

A antessala da clínica de reprodução assistida é o hospício. Mas o plano de saúde não cobre nem uma coisa nem outra. O desejo de ter um filho é o desejo de se tornar heroi. Mesmo que a maternidade ou paternidade não seja a garantia do título de heroi. Todo aquele que deseja ter um filho é alguém com um temperamento egocêntrico tão perigoso quanto o Batman. Desejar ter um filho é um sentimento íntimo e intransferível até mesmo para o mais próximo dos parceiros. Nesse sentido, o desejo é o último reduto da vontade, prestes a se exteriorizar. As pessoas desejam porque têm vontades e não o contrário. Desejar um rebento é desejar alguém para, no futuro, lhe considerar um heroi. Desejar um filho é desejar extrair seu próprio ego do seu próprio corpo, o mais alto nível de lunatismo. O desejo de ter um filho é movimentado pela vontade de olhar o rosto do próprio ego. E isso não tem nada a ver com a natureza das coisas, a justificativa mais banal dada por alguém com um desejo desses. "Ter filho é bom porque é natural".

Não gosto de exemplos práticos. Quando os uso, escolho momentos errados. Sou um generalista. Afinal, para conhecer o mundo precisamos generalizar as coisas. Nem todo cinza é igual. Nem todo redondo é perfeitamente redondo. Mas não nos furtamos de apontar coisas cinzas e redondas. Temos medo de generalizar coisas mais polêmicas. Porque somos covardes. Ter medo de generalizar é ter medo do autoconhecimento. Quem não generaliza não porta um milímetro de interesse pelas coisas relevantes da vida, e deve se concentrar apenas na novela das oito. Quem pensa que me agride com palavras do tipo "toda generalização é burra" tudo que consegue é o título de burro, somado ao de estúpido, pois a sentença "toda generalização é burra" é uma frase generalista que começa com "toda generalização". Como eu generalizo de peito aberto, eis a minha generalização de hoje: filhos "por acidente" têm melhor educação do que "filhos planejados".

Miseráveis com o desejo íntimo de terem filhos são egocêntricos demais para se preocuparem com outra vida. Eles apenas aguardam o momento de serem elogiados e chamados de herois. "Eu dei tudo para você. Ame-me!"

Esse sou eu, sentado na frente da minha casa e preocupado
com o que as pessoas pensam de mim
Em compensação, os filhos frutos do acaso, recebem de seus pais uma vida menos estável e uma educação mais abrangente. O conceito de família não existe desde sempre. É uma alucinação metafísica, assim como o conceito de sociedade. Estou me comprometendo com a afirmação de que apenas uma plataforma educacional desorganizada é capaz de refletir essa falta de contexto do homem diante do mundo.

Os anti-herois são tão interessantes justamente porque não são frutos do seu próprio desejo. Anti-heroi não é algo inventado e planejado. Ele não deseja ser aquilo que é. E essa é a graça de brincar em meio a miséria da vida.

Escrito isso, não importa o que as pessoas digam do que eu penso. Não importa o que elas pensem a respeito da minha forma de ver o mundo. Não importa que elas me coloquem no seu grupo de pessoas que não têm mãe. Enquanto alguns desejam honestamente ter filhos, eu desejo um mundo menos hipócrita. Nem eles se tornarão herois, nem eu terei o que quero. Estamos todos no mesmo nicho de estúpidos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Concordo com cada palavra.

Não consigo pensar, como pensam as gentes, que ter um filho é um ato de amor. Pra mim é puro egoísmo.

Os motivos sempre se referem aos interesses dos pais, nunca das crianças.

Eu li e recomendo um ótimo livro, "Better Never to Have Been", de David Benatar, um filósofo sul-africano, em que ele avança pontos da doutrina do antinatalismo filantrópico - não devemos ter filhos por que é ruim para ELES, mesmo que seja bom para NÓS.