segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Templo de Salomão. Esta obra não tem nada haver com Deus

Ana Zyk, do Rio de Janeiro

Mexi e me remexi no sofá ao ver a notícia, na TV Record, da construção de uma réplica do Templo de Salomão em São Paulo, pela Igreja Universal. Uma música emocionante, digna de filmes herculeanos, apresentação de números altíssimos, algo como 28 mil metros quadrados de concreto e outros números desinteressantes, mas que dão uma credibilidade incrível à matéria. Sonora com o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab que diz: "uma obra com grande valor cultural e que valoriza a diversidade étnica e religiosa de nosso país". Sonora também com Edir Macedo, que disse: ... aff, sabemos o discurso de um pastor!

Podem até pedir para que as religiões sejam respeitadas. No entanto, não pude deixar minha inquietação de lado ao ver essa matéria. É um absurdo uma igreja pensar em construir algo assim enquanto... ah, porra! Todo mundo já sabe: miséria, miséria, miséria! Todo mundo já conhece essa realidade. Caraca, será que as pessoas não veem isso? Lá no fundo, será que os próprios crentes conseguem achar que isso é um grande feito para a cidade de São Paulo, para o Brasil ou para a humanidade? A espiritualidade não está num templo, não está em grandes obras, não.

Dias atrás, vi outra matéria sobre a retirada de desabrigados de um antigo prédio desocupado do INSS, aqui no Rio de Janeiro. E é assim: constroem templos com valores "extralionários" (neologismo espontâneo) enquanto poderiam dar casas para muitas e muitas famílias. Parece chover no molhado discursar sobre os contrastes, mas é preciso de não se calar. É comum vermos injustiças e mau uso de dinheiro por parte de autoridades e poderosos, mas não podemos nos acostumar com isso.

Quero destacar aqui que não estou falando de religião, apesar dessa construção estar intrinsecamente ligada com a prática de uma, em específico. Respeito a decisão religiosa de cada um, mas eu considero uma afronta esse tipo de investimento (mesmo não sendo público). Uma afronta aos miseráveis em nossa sociedade e que são cruelmente julgados quando decidem entrar para o crime após perceberem que os poderosos lhes dão às costas. Eles devem ficar muito indignados, devem ficar com muito ódio, devem ficar muito violentos. E as respostas a Grandes Construções, como essa, estão sendo diariamente e incansavelmente mostradas na própria TV Record, que sabe explorar a violência como ninguém, mas isso já é outro papo.


Nenhum comentário: