segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Preparar, apontar... gravando!

No sertão brasileiro, há alguns anos, era comum a popular tocaia. Um jeito fácil e simples de resolver desavenças. Esconde-se um pistoleiro no meio da caatinga; ele aguarda o futuro falecido armando com uma Winchester 38. Na hora certa, abre-se fogo. Sem avisos. Nada de piedade ou senso de moralidade prévia. Quem disse que o falecido merecia conhecer o rosto daquele que foi seu algoz? Quem disse que o falecido queria ver o rosto de seu assassino? Se alguém disse, como se prova uma bobagem dessas?

Um colega, purista, me perguntou como era possível que um estudante Filosofia, preocupado com a história da ética como objeto de investigação julgasse correto o uso de equipamentos de gravação ocultos para a produção de conteúdo jornalístico. A popular câmera escondida está cada vez mais presente entre nós. Não só nas mãos de repórteres, mas qualquer um que porte um celular pode atacar de Sherlock Holmes.

A resposta para apontar essa ação como correta é mais simples que uma aula de filosofia política: o utilitarismo. Trata-se do modelo de filosofia moral que não se preocupa em afogar dois ou três tripulantes para salvar todos os passageiros.

Câmeras, gravadores e máquinas fotográficas escondidas são as Winchester da nossa época. Sem elas não teríamos as imagens de parlamentares medíocres em situações medíocres. O Repórter Giovani Grizotti é um pistoleiro moderno. Nesse caso específico, os fins justificam os meios. A justificativa utilitarista para isso é a seguinte: não podemos operar ações morais sem preocupações com a finalidade de nossos atos. Não existem ações puras, desprovidas de senso de medida. Ações praticadas sem ter como horizonte a finalidade a que se propõe são absurdas. Pode haver uma razão pura, como queria Kant. Mas o mesmo Kant só operou a moral no âmbito da razão prática.

Na prática, as coisas são sempre mais sensíveis. Coloque uma câmera no ombro e pegue um microfone na mão, vá até um desses vereadores e pergunte se ele faz turismo com dinheiro público. Servirá muito bem para piada na sala de cafezinho da câmara de vereadores.

Num país desprovido de calças, reclamar o direito, que todos temos, de não produzir provas contra si mesmo para defender essa corja é o mesmo que rezar uma missa vestindo cinta-liga.

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