segunda-feira, 22 de setembro de 2008

O Lula já começa a fazer milagres

Reinaldo Azevedo, do seu blog no site da Revista Veja

No sábado, o Estadão On Line publicou uma pequena nota com um título interessante, a saber: “Alencar recebe visita de Lula e deixa hospital em SP”. Li e pensei: “Aconteceu!” O Apedeuta já desenvolveu o dom da cura. Findo o mandato, pode deixar o PT, que é a Igreja Universal do Reino de Deus da política, e migrar para a seita de Edir Macedo, que é o PT da religião. O próprio Alencar brincou, em seu estilo um tanto bonachão: “A alta foi graças à visita dele". O vice brinca, mas tenho cá minhas dúvidas se Lula não acredita, de fato, que pode operar certos milagres — embora, evidentemente, ele tenha tanta responsabilidade pessoal na cirurgia bem-sucedida de Alencar como tem na relativa — e não mais do eu isso — tranqüilidade brasileira diante da crise.

Ironia? No comício que fez em defesa da candidatura de Marta Suplicy em São Paulo, também no sábado, ele não teve dúvida: “Deus já assumiu publicamente que é brasileiro. Ele, na sua onipotência, olha para o mundo inteiro. Mas eu acho que ele pensou: 'Agora eu vou ser um pouquinho brasileiro, já que esse Lula está aí’”. Sempre que Lula sai como uma dessas, os repórteres ampliam o seu repertório de verbos de declaração: evitam “disse”, “afirmou”, “declarou” e afins. Recorrem a “brincou”, já tentando proteger o Babalorixá de sua própria arrogância. É isto: Lula, de fato, “brinca” de emissário do Altíssimo ou de profeta: Deus falou com Abraão, com Moisés, com Cristo e, agora, fala com Lula. Mesmo Saul (depois Paulo) não teve essa colher de chá: o Senhor mandou um recado indireto, deixando-o cego (temporariamente), numa passagem em que se deduz que caiu do cavalo. E, bem, é desnecessário lembrar: Aquele Que Não Tem Nome também presenteou o Iluminado com as reservas de petróleo do pré-sal.

O Lula messiânico sabe ser bastante agressivo com os adversários, como foi nesse mesmo comício de Marta em São Paulo e em outro em Natal, em que se referiu ao senador José Agripino (DEM-RN) como “esse sujeito”. Notem: este é o Lula das eleições municipais. Imaginem como será o das eleições federais — depois que passar a nova onda que está para chegar em favor do seu terceiro mandato. Agora, ele está apenas tentando dar ainda mais musculatura ao partido para o embate de daqui a dois anos. Em 2010, vai entender que as eleições funcionarão como um plebiscito sobre os seus oito anos de governo: e ele não aceita perder. Aquela pilantragem política de registrar obra em cartório é só um aperitivo do que vem pela frente.

E Lula pode perder? É claro que sim. Bastaria que a oposição não fizesse besteira, e lhes digo que o eixo PSDB-DEM teria condições de dar uma surra eleitoral no petismo — que não é exatamente o lulismo. Mas convém desconfiar. Vejam como os tucanos não conseguem falar a mesma língua nem na cidade de São Paulo. E Belo Horizonte? É um bom exemplo? Bem, se o PSDB de São Paulo não consegue se entender, o de Minas reinventa a democracia exterminando a idéia de oposição e de alternância de poder: naquela construção, todo mundo será sempre situação.

Só um tolo não imaginaria, dado o cenário político, uma aliança Serra-Aécio como um caminho e tanto para apear o petismo. Mas quê... Muito se dizia, e com razão, que o PT sempre teve projeto de poder, mas não de governo. E era verdade. Tanto que deu seqüência ao que havia. Que se saiba, projeto de governo, os tucanos ainda não têm. E de poder tampouco. Sem este, convenham, pra que ter aquele, não é mesmo? Quando os peessedebistas não estão se juntando aos petistas num canto, estão se estapeando no outro.

Boa parte da divindade lulista decorre de ele, de fato, jamais ter enfrentado uma oposição unida e organizada, como o PT sempre soube fazer — e sabe ainda onde está fora do poder. É bem provável que a economia em 2010 não esteja a “maravilha” de agora. Mas e daí? Lula já enfrentou coisa pior do que eventuais tropeços econômicos. E seguiu adiante. Em boa parte, porque permitiram que seguisse. E permitem ainda.

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