sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Nocturne - parte IV

Essa é a penúltima parte do conto Nocturne, de Ana Zyk. Na semana que vem, a história chegará ao final. Os capítulos anteriores estão na sessão "Contos".

- Alice, há cinco anos atrás, você fez a sua escolha. Não posso acreditar que depois de tanto tempo você esteja voltando atrás. Eu sou um miserável. Negro. Sem estudos. A única coisa que sei fazer é tocar um violino. Mas somos muito diferentes. Você, Alice, é uma milionária, uma mulher inteligente, sabe falar várias línguas, uma violinista talentosa... E está casada.

- Não estou casada. Eu iria casar sim, mas antes eu lhe expliquei direitinho meu plano: iria receber a herança de meu falecido pai em um ano. Iria te mandar para a Inglaterra, compraria um apartamento e poderíamos os dois iniciar nossas aulas de música lá. Você faria faculdade e eu iniciaria meu sonhado doutorado. Se eu não casasse com Eduardo, perderia a herança e nós dois sairíamos prejudicados... Quantas vezes lhe expliquei isso, Maza?

- E a minha honra? Como me sentiria, como homem tendo que imaginar a mulher que eu amo casada com outro, transando com outro? Me afastar de você foi a decisão mais prudente no momento. Só quero tocar meu violino, Alice. Sou grato por você me proporcionar isso. Me deu o instrumento, me ensinou tudo o que sei. Lembro do primeiro dia que te vi. Tão cheirosa, linda, talentosa, no ginásio da escola. A princípio, só comecei a participar do Projeto de Incentivo aos Jovens porque vi você. Mesmo tendo só 20 anos, sabia que, de todas as mulheres que eu tinha conhecido, você era especial. Você foi a mulher que eu mais amei em toda a minha vida. Me tornou alguém. Viu em mim um homem de talento, pagou cursos, me incentivou. Mas todo o meu amor não foi compensador para a minha miséria e o fato de eu, na época, ter 20 anos, dez anos mais jovem que você e nem terminado o segundo grau.

Os olhos de Maza ainda brilhavam com o amor que sentia por Alice. - Maza, nada do que planejei deu certo. Estava quase tudo certo. Faltava pouco tempo pra eu receber a herança, menos ainda para me casar. Mas você foi embora, sem ao menos deixar um rastro, nem uma carta de amor para me consolar. Me afundei em comprimidos e anti-depressivos. Passava os dias deitada na cama, a ouvir a música em que costumávamos fazer amor. O dia inteiro, meu amor. Lembrava cada minuto em que passamos juntos. Mas há algo que gostaria de contar... e foi meu motivo maior para vir atrás de você.

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