sexta-feira, 9 de maio de 2008

A hora em que o sol se põe - parte III

Está aí a terceira, e penúltima, parte do conto da nossa colega Ana Zyk.

Acendi um cigarro. Sempre o mesmo que o dele. Nossas sombras ainda estavam iluminadas na parede. Mas agora somente o leve balanço descompassado das velas fazia-nos dançar na parede.

Ele respirou fundo.

“Tenho que te contar algo”, disse percebendo que não havia mais como guardar.

“Eu sei que tem algo a me contar. Mas não quero saber. Quero somente que você esteja por inteiro neste momento. Quero apenas que você se entregue a mim como sempre o fez. Sua vida lá fora não me interessa, meu amor. Combinamos assim. Seja meu enquanto está aqui e está tudo bem. Mas você não está sendo meu. Eu quero você. Se entregue por inteiro... é só o que te peço”.

“Eu tenho que te contar! É inevitável.”

“Por que você está destruindo nosso trato? Não quero ouvir, não me conte nada, apenas me ame...estou ficando aflita, por favor, não me conte nada”.

“Pare, Rosana! Ouça-me...”

“Tenho med...”

“Vou ter um filho com minha esposa e por isso não quero mais manter nossa relação!”

Silêncio...

Meus olhos iluminados pelas velas dançantes permaneceram estáticos fitando-o, incrédula. Minha garganta amargurou. Minhas traquéias fecharam-se não permitindo que meus pulmões pudessem respirar. Meu coração parou, não havia sangue para bombear, pois ele estava congelado em minhas veias.

Desvio meu olhar dele e olho para as chamas das velas, que continuam a se mover. Observo sua dança. O que aconteceu com a dança tão ritmada? Olho para a parede. Vejo nossos corpos divididos. Sem movimento. Volto a fitá-lo.

“Por que você me contou? Ficaria a vida inteira sem saber e estaria muito feliz com você! Por que você me contou que vai ter um filho com ela? Eu não queria saber de nada de vocês, nada de sua vida! Nós combinamos cacete! Por quê?

De repente, assim como a parafina da vela derretendo em contato com o fogo senti lágrimas minarem meu rosto.

“A questão é que eu não quero mais ficar com você por causa do meu filho. De nada adiantaria nosso trato nesse momento. E assim será mais fácil de você me esquecer e de nos esquecermos. Você me encheria de perguntas se chegasse simplesmente dizendo que queria terminar, Rosana”.

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