sábado, 11 de maio de 2013

Revisor


Eu adoro esse tipo de coisa. Algumas empresas são a verdadeira vanguarda da retaguarda. Hoje vi uma vaga de revisor em um jornalão. Não julgo que meu famigerado nome possa ser cogitado. Inscrevi-me pelo interesse dos caras em fazer um processo de contratação diferenciado. Sem currículo. Sem carta de apresentação. E sem aquelas coisas que todo mundo pede e não servem para nada. Pediram um texto com um tema: "sua experiência como revisor". Tá aí, oh:

Ser revisor é a única profissão editorial que transforma alguém desconhecido e irrelevante em uma mistura de deus e demônio. A prova da onipresença do revisor está ligada ao fato da exigência de revisores para revisar os textos dos revisores. “Todo mundo precisa ser revisado”, diz a norma tácita em qualquer redação. Escritor apegado ao próprio texto ganha imediatamente o título de ruim. Repórter bom nunca é o último responsável pelo que escreve. Não há notícia de um escritor bom sem um revisor de navalha afiada e retidão textual. Seja na revisão literária ou na padronização exigida pelas redações dos periódicos, o revisor é o mais amado e criticado dos profissionais do texto. Seu nome não tem destaque algum e suas opiniões são importantes apenas quando ganham pouca publicidade. Revisor bom trabalha em silêncio. Suas alterações já são barulhentas por conta própria. 

A regra manda frases curtas e objetivas. O gênio ignora as regras para criar. Como teria sido a vida de Gabriel García Márquez sem a dureza dos revisores? O que passaria pela mente de um revisor ao se deparar com uma frase de sete páginas, publicada em Cem Anos de Solidão? Muita discussão teórica e inútil deve ter sido travada sobre alterações inaplicáveis ou urgentes da grande obra épica colombiana. Posteriormente, centenas de páginas foram desperdiçadas em artigos acadêmicos que jamais serão lidos debatendo a genialidade inexplicável. Nem uma vírgula terá como objeto de preocupação a riqueza da sensibilidade dos revisores subversivos. Gênios do quilate de Gabo subvertem as regras para se sobressaírem, entre os medíocres. Revisores desesperados se preocupam com as regras porque são subvertidos pela natureza do seu trabalho. Esperar valorização em um ambiente desses é como tentar brilhar mais que o sol. Deve haver sérias vantagens em receber o título de deus ou demônio. Algo que ultrapasse a mera necessidade deve explicar a existência de pessoas interessadas em fazer o trabalho sujo. 

5 comentários:

Desconhecido disse...

*Brilhar

Revisor revisando.

Abraços!

Desconhecido disse...

*Brilhar

Revisando o revisor.

Everton Maciel disse...

foi o que eu disse. Grato.

cs.isabela@gmail.com disse...

Seu texto é bom! E essa é só uma justificativa para dizer porque falta no seu blog um lugar para doações.
Você tem leitores fora do país, claro, as pessoas às vezes saem do Brasil e acabam não voltando. Desnecessário citar motivos, mas muitos ainda querem saber como anda a "pátria amada".
Algumas pessoas já fazem doações para continuarem tendo acesso a conteúdos que lhe interessam.
Seu conteúdo interessa! E eu, por exemplo, já teria feito uma doação se isso fosse explícito no blog.
Ou simplesmente porque é uma tendência de futuro para os conteúdos de credibilidade. Você e seus leitores podem se beneficiar com isso.
Designer, psicóloga revisando.

Everton Maciel disse...

Mais uma vez, obrigado, Isabela. Sinceramente, não acho que as doações seriam relevantes do ponto de vista prático. Antes, até acompanhava o número de acessos. Agora, não me importo mais com esses detalhes. De resto, sigo fazendo o que sempre fiz. Quem sabe, amanhã melhor que hoje.