domingo, 24 de janeiro de 2010

Breve nota sobre o conceito de família

Uma das coisas mais impressionantes para um observador, atento na transição entre os séculos 20 e 21, é a manutenção da família nuclear - composta por papai, mamãe e filhinhos. Já suspirei esse assunto aqui no blog. Simplesmente, não consigo entender como as pessoas pensam e construir civilidade com um modelo tão rudimentar e ultrapassado de convivência. Sabe aquela conversa positivista: "família é o lugar onde a pessoa se sente bem, independente do grau de parentesco firmado entre os envolvidos?" Tudo bobagem. Não funciona assim na prática. No nosso cotidiano não conseguimos compreender que é justamente fora dos lares nucleares onde a diversidade pode ser encontrada.

Nunca conseguiremos uma pluralidade cultural mantendo um modelo tão arcaico. Toda vez que ouço um psicólogo ou um pedagogo falando da importância dos pais na educação dos filhos meus nervos inflam. Não se trata de um ataque intransigente e indiscriminado. Apenas, fico pensando, preocupado, o que passa pela cabeça de uma criança cujo pai abandonou a mãe e mantém pouco - ou nenhum - contato com seus rebentos. Sabemos que essa é uma situação cada vez mais comum.

É preciso uma compreensão mínima de que essas crianças são seres independentes, novos e com toda uma vida inteira pela frente. Atrelar sua existência a uma dupla de genitores é o princípio de um assassinato intelectual irreparável.

A quantidade de meninas, ainda, tentando dar o famoso "golpe da barriga", na esperança de que serão correspondidas pelos seus namoradinhos, é impressionante. Muitas vezes, essas pobres afetadas buscam em seus tenros e instáveis relacionamentos juvenis aquilo que não tiveram em casa: uma família estável. Minha pergunta é mais simples do que parece: por que diabos elas querem uma família? Precisam disso como pré-requisito para algum tipo de felicidade metafísica? Convenhamos.

Lógico que a resposta não é tão simples quanto a pergunta. Mas, basicamente, esse tipo de fenômeno psiquiátrico continua sendo comum porque essas meninas foram educadas para pensar que ter uma família é algo bom. Em contrapartida viver sozinha, conviver consigo mesmo ou cuidar de um animalzinho é algo ruim, coisa de titia solteirona.

Certa vez, numa sala de ensino médio, perguntei aos alunos quantos viviam com seus pais e suas mães. Lembro que o resultado não passou de 40%. Claro que essa rápida pesquisa é arbitrária. Com certeza, reflete uma realidade diferente de outros lugares. Mesmo assim, é sinal de que algo prático foi alterado nos últimos anos. No entanto, o ideal de família nuclear se arrasta. É a velha bandeira Tradição, Família e Propriedade, importante na Revolução Francesa, mas ultrapassada para a sociedade contemporânea.

A educação feita pelo Estado, como sugeriu Platão, na sua República, ou Aldous Huxley, no Admirável Mundo Novo, seria um modelo ideal? Não sei e não importa. A distância dessas projeções não nos permite cogitar uma solução tão radical. Apenas, resta lamentar profundamente a forma como o atual modelo funciona e alertar as pessoas para que reflitam sobre o assunto.

A família nuclear contemporânea não passa de um ritual mantido desde a segunda metade do período feudal. Sua constante manutenção não provoca resultados significativos. Apenas, afasta-nos de uma humanidade digna, plural e razoável.

4 comentários:

Red disse...

Nosso modelo de papai-mamãe-filhinho faz com que as pessoas apedrejem uma solteirona bem resolvida e bata palmas para uma "mãe de família" que seja amargurada, frustrada e infeliz.

Diógenes Roncatto disse...

Quantas famílias são só de fachada e não vivem o verdadeiro espírito de família? As vezes convivem em uma relação doentia e insistem em continuar no erro...

blogpraque disse...

Corri os olhos pelo texto e, na corrida, penso que está equivocado, tentanto colocar a culpa na família. O problema não é a família e sim os inconsequentes que colocam seus filhos no mundo. Na maioria, homens em busca de sexo, mulheres em busca de relacionamento estável, um enganando o outro por alguns momentos de prazer ou casamento, gerando pessoas para o resto da vida.

Sem Papel e Tinta disse...

Blogpraquê, não estou equivocado. Nem você. Dissestes a mesma coisa que eu. Chamo atenção para o que você nota no quarto parágrafo. Independente disso, certo é que as pessoas continuarão fazendo filhos e algo precisa ser repensado no conceito de família, sim. Obrigado pela visita no nosso famigerado blog.