sábado, 16 de agosto de 2008

Satolep, o livro

Escritor pelotense fecha o ciclo de Satolep, a cidade imaginária

Everton Maciel, de Pelotas

Satolep, cidade “Macondo” do escritor Vitor Ramil, é um lugar úmido, onde a luz do dia cumpre o mesmo papel nostálgico que a lareira noturna: manter a umidade no seu devido lugar.

O novo livro de Ramil encerra um ciclo inaugurado quando a imaginária Satolep foi emancipada de Pelotas. Naquela época, o escritor tinha 19 anos. A letra da canção apresentava uma cidade conhecida, mas o ângulo não era o coloquial: O limiar da verdade/ Roçando na face nua/

“A palavra ‘Pelotas’ não cabia na prosódia da música. Simplesmente, inverti, sem saber o motivo. Ela se encheu de sentido, adotei e ficou”, conta o compositor e escritor.

Hoje, a Satolep que Ramil tem para apresentar está composta em 280 páginas prodigiosas. O livro é elaborado com o mesmo punho que mistura o fôlego de romancista com a sutileza do poeta. A obra ganha mais significado quando lida em Pelotas, de preferência, em meio ao frio do mês de junho. No lançamento, que aconteceu na última sexta-feira, 13, na Secretaria de Cultura de Pelotas, o autor lembrava uma cidade atemporal. A epigrafe “dispersei-me no tempo cuja ordem ignoro”, escrita originalmente nas Confissões, de Santo Agostinho, resume o espírito da obra.

Satolep conta a história de Selbor. Um fotógrafo que enfrenta seu passado, voltando para sua cidade natal, durante seu aniversário de 30 anos. Ramil não gosta de estabelecer historicidade cronológica ao próprio livro: “O tempo é antigo em função das fotografias de 1922. Mas em nenhum momento do livro se fala em data. Nenhum período é fixado, definido. É uma brincadeira com tempo”, explica.

As fotografias tornam o livro ainda mais especial. Ramil conseguiu reunir o material publicado no Álbum Pelotas, organizado por Clodomiro Carriconde. O material serviu como ponto de partida para o romance. A tiragem da primeira impressão de Satolep é de três mil exemplares. Na noite de lançamento, Ramil autografou mais de 200 livros. Ao atender o autógrafo de uma menina de 10 anos, o escritor perguntou: “Giovanna... com dois enês?”

“É”, respondeu a Giovanna com dois enês. Ela usava um volumoso casaco cor-de-rosa, meias multicoloridas e sapatos brancos. Com as mãos enterradas nos bolsos, Giovanna aparentava um grande interesse de escapar do frio. Para ela, naquele momento, isso não era tão importante quanto ressuscitar os braços e estendê-los ao escritor.

Satolep fará com que Ramil dê, ainda, muitos abraços. Ele é um dos autores convidados para a 6º Festa Internacional Literária de Paraty. Além dos compromissos com o lançamento do livro, o Prêmio TIM de Música (Melhor Cantor, Voto Popular) coloca o pelotense no cenário nacional com mais força. Falando sobre a conquista, Ramil ressalta que sua popularidade não se dá em virtude da “grande mídia”: “O prêmio é importante. Eu tenho um público muito fiel, ligado com o meu trabalho. E não sou um artista da grande mídia. Não sou popular no sentido contaminado. A premiação acaba sendo uma amostra desses tempos onde estamos vivendo, com a internet, uma mídia revolucionária, onde os indivíduos podem se manifestar. Isso é muito bom para mim e para meu público, que tem sua voz ouvida”, comenta Ramil.

O frio úmido que assustava Giovanna foi o primeiro convidado a chegar ao lançamento do livro editado pela Cosac Naify. O evento começou às 19h, mas o frio chegou antes. Bem antes. Junto com sua companheira umidade, ele já estava presente na essência de Satolep.



(A reportagem foi publicada originalmente na Revista Afinal. A 11ª edição da revista de maior circulação na região Noroeste do Estado ainda está com cheiro de tinta, acabou de sair da gráfica. O material é editado pelo colega Gerson Rodrigues e circula nas cidades de Três de Maio, Santa Rosa, Boa Vista do Buricá, Independência e agora Santo Cristo. Tudo que é feito com carinho dá certo: a publicação periódica chega ao seu segundo ano)

Um comentário:

Anônimo disse...

Você é suspeito p/ falar 'bem' da revista.

Você é colunista colaborador!!!

Abraço e obrigado! Vc engrandece a publicação!